O Cais da Lusofonia
Portugal

O Cais da Lusofonia


A ideia de transformar Portugal num cais do mundo, onde param barcos de todas as proveniências, aonde chegam mercadorias e passageiros de todos as paragens, onde se operacionalizam transações de todos os tipos e naturezas, representa uma alegoria literária muito rica e cuja aplicação prática deveria constituir um desafio para todos nós.

Os portugueses deixaram um traço distinto na história do mundo nos últimos séculos. A amplidão da sua ação numa enorme parte do mundo durante os séculos XV a XX é surpreendente. Pode falar-se, sem receio de exagerar, de uma gigantesca epopeia coletiva. A História do mundo não pode escrever-se sem numerosas referências ao que nele foi praticado por este pequeno povo de um pobre país nos confins da Europa. ?Como foi possível que um povo tão pouco numeroso tivesse feito tanto??, questionava-se o professor José Hermano Saraiva. ?Por toda a Terra se ouvem as suas vozes e até nos confins do mundo ressoam as suas palavras?, escreveu Damião de Góis.


Chegados que estamos ao século XXI, perdemos o nosso estoicismo, vivemos encobertos por uma névoa de indiferença generalizada, não somos mais uma paragem obrigatória nas decisões e nos fluxos de informação, fomos esquecidos e somos tantas vezes ignorados, mas o nosso traço ficou nos locais por onde passamos e esta é sem dúvida uma das nossas principais mais valias.

Temos a felicidade de integrar a rota dos países do futuro; o Brasil, Angola, Moçambique... o oriente. As raízes do nosso relacionamento são muitas. Uma língua partilhada, uma literatura partilhada, um sistema legal partilhado, uma religião partilhada e, desde o princípio, uma teia finamente tecida de costumes e de tradições que diferenciam as nossas nações e formam a lusofonia.

Apesar da nossa matriz europeia, apesar do nosso molde iluminista e liberal, apesar das nossas ligações comerciais serem sobretudo continentais, o nosso traço é lusófono, muitos dos nossos hábitos foram adquiridos pelo mundo dos descobrimentos, a nossa matriz é cada vez mais a da miscigenação das raças que fomos encontrando e o nosso espírito é o do inclusão e o da abertura.


Temos a obrigação de promover esta ligação particular e distintiva, estes povos fazem parte da nossa rede de conhecimentos, integram a nossa lista de contactos, têm um conjunto imenso de afinidades connosco, compreendem a nossa forma de pensar e a nossa maneira de estar, devemos por isso potenciar estes relacionamentos, aprofundar estas ligações, partilhar os nossos contactos, promover o conhecimento e o desenvolvimento, a partilha de experiências e a promoção de produtos e serviços nacionais.

Existem alguns grandes eixos/vias de atuação que devem ser desenvolvidos e potenciados. Em primeiro lugar, e desde logo, a educação e a formação. Em segundo lugar, a identificação de centros de excelência que estamos a desenvolver, a melhorar ou cujas boas práticas estamos a consolidar, como, por exemplo, ao nível da reforma do estado, a regulação ou o empreendimento das reprivatizações. Em terceiro lugar, o mar, um dos ativos mais ricos e relativamente ao qual devemos ter mais experiência e conhecimento adquirido. Em quarto lugar, a inovação que tem assumido proporções de referência em tantas áreas e em tantos setores. Em quinto lugar, a diplomacia e a nossa capacidade de relacionamento com outros países, dentro e fora da Europa.

Estes são alguns exemplos de áreas de atuação que devem ser desenvolvidas e aprofundadas no seio dos países lusófonos. Dentro deste núcleo, é possível criar circuitos de conhecimento e de intercâmbio que beneficiem todas as partes e facilitem o aperfeiçoamento e o estreitamento de relações. Proximamente, procurarei desenvolver cada um dos eixos identificados sempre com a perspetiva de marcar/vincar a posição de Portugal no mundo.

Termino com Fernando Pessoa, que, no início do século XX, dando voz a uma tradição literária profética, vaticinava, para Portugal, um novo Império, não já material, mas cultural. Mais uma vez, o povo português "partirá em busca de uma Índia nova, que não existe no espaço, em naus que são construídas daquilo de que os sonhos são feitos."



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